Cerca de dois anos após os atentados terroristas de 11 de setembro de 2001, os Estados Unidos invadiram o Iraque do então governante Saddam Hussein. Na ocasião, os EUA tentavam provar ao mundo que o regime de Hussein teria armas de destruição em massa – e as provas apresentadas na época eram bastante risíveis. Mesmo sem grande apoio da comunidade internacional, o Iraque foi invadido e a ocupação estadunidense se iniciou.
Como era de se esperar, as Nações Unidas tinham uma embaixada no país invadido, e o brasileiro Sérgio Vieira de Mello era o representante oficial do Secretário-geral das Nações Unidas para o Iraque em Bagdá. Foi ali que, em 19 de agosto de 2003, um carro bomba vitimou não só Sérgio, mas também outras 21 pessoas que estavam no escritório da ONU.
Sérgio Vieira de Mello era filho do diplomata Arnaldo Vieira de Mello, que foi compulsoriamente aposentado pelo governo militar, em 1969. Sérgio, que acompanhou o pai em várias missões, estudou na Universidade de Paris onde obteve não apenas a licenciatura, mas o mestrado e o doutorado em Filosofia. No ano em que seu pai foi aposentado, Sérgio iniciou sua trajetória nas Nações Unidas, especialmente no Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR).
De 1969 até seu falecimento, em 2003, Sérgio Vieira de Mello serviu em diversas missões de paz e missões humanitárias das Nações Unidas: Bangladesh, Sudão, Chipre, Moçambique, Líbano, Camboja, Iugoslávia, Ruanda e Timor Leste. Não houve lugar conflituoso no mundo que Sérgio não esteve, e ao seu domínio de idiomas (com fluência falava – além do português – francês, inglês, espanhol e italiano) somava-se uma rara habilidade em negociação e um extenso conhecimento das Relações Internacionais, da política internacional e da história dos mais diversos povos.
Os ideais de Sérgio sobre a paz, o diálogo, os Direitos Humanos e a construção de sociedades igualitárias e justas, misturavam-se aos objetivos da própria ONU, onde Sérgio foi o primeiro brasileiro a alcançar o alto escalão. Com muita coragem e carisma, Vieira de Mello negociava firmemente com grupos armados e rebeldes, com governantes e com outros diplomatas. Samantha Power, que escreveu sua biografia, o descreveu como “uma mistura de James Bond com Bobby Kennedy”, e a preferência de Sérgio pela ação e não pelos escritórios certamente faz jus a essa descrição.
Não há como descrever o legado de Sérgio em poucas palavras, e, certamente, sua vida foi o exemplo do esforço que as Nações Unidas devem ter para “preservar as próximas gerações do flagelo da guerra” – como diz sua Carta constitutiva. Dezenove anos após sua morte, uma certeza é clara: o mundo seria muito melhor se Sérgio ainda estivesse conosco. Que sua história possa sempre ser lembrada, e que sua vida motive ainda muitas gerações na busca pela paz e pelo diálogo.
*João Alfredo Lopes Nyegray, doutorando em estratégia, coordenador do curso de Comércio Exterior e professor de Geopolítica e Negócios Internacionais na Universidade Positivo (UP). Siga no Instagram @janyegray